Fonte: Blog Saúde do Meio
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O Brasil é o décimo maior consumidor de energia do mundo e o maior da América do Sul e o preço da energia é um dos mais altos do mundo. Devido à imensa quantidade de rios existentes no território nacional, 73,63% da energia produzida no país tem como fonte geradora as hidrelétricas.
Para algumas empresas, a energia é uma ferramenta de produção, e isso dificulta qualquer tentativa não planejada de redução de custos.
Consumir a energia elétrica de forma eficiente é vital para um bom desempenho e até mesmo para aumentar a competitividade das empresas.
Com um cenário de risco de desabastecimento de água e alta dos preços de energia elétrica, algumas empresas estão capacitando seus gestores para compreender o consumo de energia das instalações de sua empresa e explorar alternativas para reduzir ou tornar o consumo mais eficiente.
Conversei com Marcos Aires, diretor-presidente da Datte Educação & Treinamento e um dos responsáveis pelo “Programa Educacional de Eficiência Energética” – PEEE, um projeto que faz parte do Programa de Eficiência Energética da CEMIG.
Aprovado pela ANEEL, este projeto capacita profissionais das indústrias de sua área de concessão, visando disseminar conhecimentos que gerem projetos e obras de Eficiência Energética. Os principais objetivos são reduzir consumo, demanda e custos de clientes, prioritariamente industrial, através de capacitação em Gestão Eficiente de Energia e formar uma cultura de uso inteligente de energia nas empresas e instituições dos diversos setores da economia.
Adriana Santos: Como o programa pode contribuir para a redução de gastos com energia das empresas?
Marcos Aires: No treinamento, eles aprendem duas formas de reduzir seus gastos com energia: a primeira por meio da correta contratação, chamamos de adequação tarifária, o participante aprende como contratar adequadamente a demanda e o consumo, considerando as diversas opções que possui; a segunda é pela redução efetiva do consumo específico de energia da instalação onde trabalha por meio do conhecimento de atitudes e novas tecnologias que reduzem o tempo de funcionamento ou a potência dos equipamentos, o que permite o estabelecimento de ações ou práticas de redução do consumo de energia e, consequentemente, dos gastos. O curso além de indicar essas atitudes e tecnologias, estimula os participantes a praticarem e confirmarem esse benefício. Ele, por usar a técnica de ensino a distância, torna-se um treinamento no trabalho (” training in job “) com resultados imediatos. Algumas empresas participantes já percebem a redução de seus custos com energia e água durante o treinamento.
Adriana Santos: Qual a metodologia do curso e carga horária?
Marcos Aires: PEEE é um programa de capacitação e pesquisa, administrado na forma de Ensino a Distância e treinamento prático no trabalho e seu conteúdo equivale a um treinamento presencial de cerca de 290 horas aula, podendo ser realizado num período de 8 a 12 meses. São mais de 14 disciplinas que abrangem diversas áreas do conhecimento como: legislação, meio ambiente, comunicação, engenharia (usos finais de energia, medição e verificação), gestão energética e economia (viabilidade econômica).
O programa é dividido em diversas etapas, intercalando atividades práticas, teóricas e eventos presenciais para motivação e esclarecimentos. As etapas geram produtos (readequações tarifarias, levantamento de consumos, projetos de eficiência, entre outros) ao final de suas execuções e esses são avaliados e pontuados por engenheiros tutores e consultores.
O programa conta ainda com fóruns de discussão e plataforma de comunicação entre alunos e tutores que possibilitam uma maior interatividade entre estes.
O ensino a distância apresenta vantagens como: treinamento de profissionais de diferentes locais dispensa os custos de deslocamento, hospedagem e alimentação, pode ser realizado em horário mais conveniente para empresa e profissionais, não afetando significativamente a rotina do participante.
Adriana Santos: Quais as medidas preventivas para reduzir o consumo de energia nas empresas sem prejudicar a produtividade, em especial das pequenas empresas?
Marcos Aires: Não é interessante reduzir o consumo reduzindo a produtividade, é melhor explorar maneiras de não afetá-la negativamente. O treinamento desenvolvido pela DATTE que está sendo promovido pelas distribuidoras Cemig e CPFL para seus grandes consumidores, visa, principalmente, a redução do consumo específico das empresas para torná-las mais competitivas.
O primeiro passo é conhecer o consumo, depois conhecer alternativas técnicas ou gerenciais que promovam economia sem reduzir a produtividade. As reduções podem ser obtidas por troca de equipamentos por outros mais eficientes, distribuição do consumo ao longo do dia a fim de diminuir sobrecargas, políticas internas de conscientização que promovam bons hábitos de conservação de energia, e muitas outras. O programa leva o participante a promover soluções criativas e mais adequadas para a realidade de suas instalações.
Dentre as medidas que os próprios participantes têm indicado, apontamos os desligamentos de cargas (lâmpadas, motores e equipamentos) que ficam ligados sem necessidade ou que podem ser usados em outros horários quando o custo da energia é mais barata. No caso de a iluminação usar mais a luz solar durante o dia, usar sensores de presença e uso de lâmpadas mais eficientes, como as com tecnologia de LED. No caso da força motriz, utilizam equipamentos com eficiência maior e acionados com conversores de frequência que possibilitam os motores a trabalharem de acordo com a carga que é necessária naquele momento.
Adriana Santos: Como os colaboradores de uma empresa podem contribuir para a redução de gastos com energia elétrica?
Marcos Aires: A conscientização é o melhor caminho, através dela é possível que os indivíduos promovam ações em prol da conservação de energia. No PEEE os alunos são orientados a organizar uma comissão multiprofissional, composta por membros de vários setores, para que juntos mantenham a cultura do uso racional de energia. No treinamento ela é chamada de CICE, Comissão Interna de Conservação de Energia.
O programa dissemina a filosofia de que a tarefa de reduzir os gastos com energia é de todo o grupo, por isso todos devem ser envolvidos, conhecerem as oportunidades e participarem de sua implantação. Dessa forma, além de se sentir prestigiado, o empregado ou colaborador da empresa passa a ser um protagonista da eficiência energética na empresa. Mesmo aqueles que não tomam uma atitude proativa, sendo comunicados e envolvidos nos programas das empresas, passam a serem colaboradores (desligam lâmpadas ou outras cargas), indicam oportunidades para os colegas, etc.
Somente com o envolvimento de todos, a começar pela alta direção da empresa, o programa pode alcançar sucesso e ser um programa contínuo e sustentável ao longo do tempo. Ele deve ser independente de crises e conjunturas adversas e não pode ter apenas um ou uns atores principais, todos têm que ser envolvidos.
Adriana Santos: Qual a principal medida para reduzir o consumo de energia?
Marcos Aires: Ter uma compreensão do consumo, do custo e de alternativas para redução de ambos. Existe muito senso comum em se tratando de promover economias, mas na realidade cada instalação tem suas peculiaridades e as soluções são personalizadas, podendo ou não se assemelhar a outras. Trocas de lâmpadas podem promover grande economia em uma empresa, mas pode ser uma economia irrisória em outra, na qual a troca de equipamentos com resistências teria mais impacto na redução, por exemplo. O PEEE promove essa consciência crítica nos participantes, proporcionando medidas customizadas e realistas para a empresa.
A primeira medida é conhecer como se dá o consumo, medindo. Somente podemos gerenciar o que se mede. Depois conhecendo-se técnicas e tecnologias adequadas, aplicá-las para reduzir o consumo.
Não se deve falar em redução do consumo e muito menos em metas de redução deste. Falar em eficiência energética é falar em diminuir o consumo específico, a quantidade de energia para se produzir uma unidade de produto. Ao se produzir mais com menos energia, as empresas ficam mais competitivas e podem, inclusive, aumentar o consumo, desde que acompanhado pelo aumento da produção. Outra alternativa é identificar produtos com maior valor de venda usando processos que podem ser mais até mais intensivos em energia, mas promovem receitas e lucros maiores. Enfim, eficiência energética não deve ser pensada como uma forma de reduzir custos e sim de aumentar a competitividade.
Adriana Santos: Qual seria o principal setor de uma empresa para gerenciar os programas de redução de gastos com energia elétrica?
Marcos Aires: A melhor forma é organizar uma comissão multidisciplinar, pois a questão energética é uma realidade de todos nas empresas. No PEEE, os participantes recebem instruções de como formar estas comissões e promover ações de conscientização, como comunicações internas e promoções de metas e eventos.
O PEEE é indicado para administradores, engenheiros, gerentes de energia, gerentes de manutenção, técnicos, coordenadores, supervisores, trainees, profissionais de manutenção entre outros profissionais.
Como abordado, anteriormente, a alta direção da empresa deve ter a preocupação de produzir usando o mais racionalmente a energia, não necessariamente através da redução dos gastos, mas com o uso eficiente e produtivo da energia. Utilizando o momento atual como exemplo, veja que se uma empresa tivesse a meta de reduzir seu consumo em 10%, ela pode alcançá-lo facilmente com a queda da produção. Não é isso que queremos.
Assim o principal setor a promover a eficiência energética deve ser a alta direção, que deve estipular metas de consumo ou custos específicos com energia. Cabem às demais áreas da empresa, cada qual em sua especialidade, identificar oportunidades para colaborar no alcance dessas metas. Isto será possível com os conhecimentos adquiridos no PEEE.
Adriana Santos: Qual a porcentagem de redução de custos de energia com a aplicação da metodologia do curso?
Marcos Aires: Depende dos usos finais da empresa, do tempo de vida dos equipamentos, das práticas de manutenção, do controle que é realizado, do valor da fatura de energia e da importância ou participação dos custos da energia no custo total do produto. Ė muito arriscado citar um número, mas é certo que economias ocorrerão muito superiores ao investimento com o treinamento.
Somente com adequação tarifária pode-se alcançar de 1 a 10%, mas temos casos de reduções maiores, depende de quão mal as empresas estejam em termos de gerenciamento energético.
Em termos de eficiência energética, ressaltando, novamente, que o objetivo não é a redução de gastos e sim do consumo específico, pode-se alcançar até 100% de redução, como é o caso de soluções que envolvam a cogeração de energia, quando as empresas produzem sua própria energia a partir de resíduos ou combustíveis que já consomem usualmente.
A tecnologia LED permite reduções superiores a 30% do consumo da energia gasta em iluminação, em alguns casos. No entanto, em grandes indústrias, a iluminação representa menos do que 5% de seu consumo, logo se as medidas se concentrarem apenas na iluminação a LED, os resultados serão inferiores a 2%.
Enfim, a porcentagem dependerá do esforço e conhecimento de toda a equipe envolvida e da situação energética em que se encontra a empresa.