Fonte: O Liberal
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No momento em que o País discute uma nova realidade de escassez de energia e que os preços das tarifas não param de ser reajustados, pressionando cada vez mais o bolso dos consumidores, sobretudo do Pará, que pagam as contas de luz mais caras dentre todos os Estados brasileiros, um estudo sobre eficiência energética no Brasil acirra esse momento de crise, mostrando o impacto do crescente aumento do desperdício desse insumo nas regiões. Só na região Norte, por exemplo, o levantamento da Associação Brasileira das Empresas de Serviços de Conservação de Energia (Abesco) aponta um desperdício em torno de quase 9,5% de tudo o que foi produzido em 2014. Em números, essa proporção equivale a perda de 3,2 mil giga-watt-hora (GWh), que em valores corresponde a cerca de um bilhão de reais jogados fora.
O dado é ainda mais alarmante na análise dos últimos seis anos. Os Estados nortistas respondem pelo desperdício de 18,5 mil GWh, o equivalente a 2,2 usinas hidrelétricas de Tucurí. Em custos, são exatos R$ 5,3 bilhões desperdiçados desde 2008. “Apesar dos dados serem regionalizados e mostrarem esses números do Norte, é claro que o Estado do Pará tem um certo protagonismo nesses resultados, por toda a importância que ele representa para a região, quanto ao número de residentes e indústrias”, analisa Alexandre Moana, diretor-técnico da Abesco. Em todo o País, nesse mesmo período, o estudo da Abesco detectou a ineficiência energética de 298,7 mil GWh, com valor de desperdício na casa dos R$ 80 bilhões, citada no estudo como “o dobro do que está sendo investido na usina de Belo Monte”.
Alexandre Moana destaca que a sangria é ainda mais evidente na análise específica do consumo de energia nas residências, na indústrias e no comércio. “Nós analisamos qual era a potencia necessária para alimentar o consumo desses segmentos e qual era a categoria do desperdício típico de cada um deles. Apesar da consolidação desses dados nacionalmente, constatamos que os números por segmento foram praticamente iguais em todas as regiões. O maior diferencial é o fator climático. Por exemplo, no Pará usa-se mais o ar-condicionado do que em São Paulo, mas isso não é considerado desperdício por estar se gerando trabalho com esse equipamento. É apenas um consumo diferenciado, que, no geral se equipara”, disse.
Pelo estudo, as residências concentram um percentual de 15% de energia desperdiçada. No último ano essa proporção indicou o desperdiço de cerca de 20 GWh, proporcional a R$ 5,51 bilhões indo pelo ralo. Na apreciação dos últimos seis anos, esses números foram: 119,1 GWh e R$ 32,95 bilhões. O setor indústrial responde pela segunda maior ineficiência energética, com margem de 6,20%. Em números são 11 GWh desperdiçados em 2014, e 77,3 GWh, desde 2008. Já em valores são R$ R$ 2,61 bilhões e R$ 18,27 bilhões, respectivamente. O comércio, por sua vez, chegou a desperdiçar 9,8 GWh em 2014, com prejuízos calculados em R$ 2,8 bilhões. Em seis anos, esse desperdiço saltou para R$ 16,22 bilhões, referente a marca de 57,4 GWh sem uso.
A fonte desses desperdícios, indica o estudo, são os equipamentos obsoletos e processos inadequados nas empresas, além de geladeiras, aparelhos de ar-condicionado e ferros de passar roupa obsoletos nas residências. O executivo da Abesco chama a atenção da necessidade do governo federal lançar campanhas pelo consumo consciente de energia e, principalmente, incentivar os grandes empreendimentos industriais e comerciais a modernizarem seus sistemas de utilização de energia para reduzir os desperdícios estruturais. Moana avalia que o momento crítico que o Brasil vive atualmente, ocorre, justamente, pelos equívocos e falta de sensibilidade do governo.
“Quando foi reduzido o valor da energia para o consumidor final, por decreto da presidente Dilma Rousseff, muitos projetos de ciência energética passaram a ter um benefício menor. Como isso acontece? Se você estava esperando uma redução do seu custo com energia, baseada em uma alteração técnica, como em troca de motor, lâmpadas, ou de uma linha de produção mais eficiente, e você calcula um retorno desse investimento em cinco anos, você se baseia em valores presentes. Porém, se este valor é reduzido, como aconteceu, o investimento afunda, porque o seu retorno pode vir somente após dez anos, justamente, porque o preço da energia ficou menor. Ou seja, não adianta apenas medidas técnicas. É uma questão de criação de mecanismos e contexto”, avalia.
“Eu sugiro que para essa sintetização ocorrer, tem que haver um sistema de premiação, como houve na época do apagão, em que exista a saída de algumas cargas nesse segundo horário de ponta. Quando fui à Belém, em 2009, lá já se tinha um consumo que saltava aos olhos no horário de 14h às 15h30, que é o segundo horário de ponta, de gargalo. Então, se considerar esse segundo horário de ponta, assim como é das 18h às 21h, você cria um mecanismo de sintetização automático. Ou seja, as soluções começam a vir de forma mais espontânea. São esses os mecanismos que fazem com que haja eficiência energética e não soluções pontuais, que todos conhecem. Todo mundo sabe, que tem desligar o interruptor quando sair do quarto para economizar energia, todo mundo sabe que se você trocar um motor de alta eficiência por um de baixa cai o consumo. Qualquer criança sabe a solução pontual técnica. A questão é o mecanismo que faze isso acontecer, que infelizmente não estamos vendo nesse momento”, completa.
Essa proposta do segundo horário de ponta, das 14h às 16h, principalmente para as regiões Norte e Nordeste, foram apresentadas ao Governo Federal, junto a uma lista de sugestões da Abesco. Na descrição, explica o diretor da Abesco, foi salientado que “trata-se de um mecanismo para não onerar o crescimento da indústria local, que já extremamente prejudicada”. “Essa proposta, eu trouxe para Aneel no ano passado e ainda sugeri um mecanismo para ter um ‘horário compensar’, ou seja, ficava mais caro nesse horário de 14h às 15:30h e barateava das 21h às 6h da manhã. Então, isso, com certeza, impulsionaria um crescimento regional, estagnado hoje, por falta de incentivos. Para se ter uma ideia, de 2004 pra cá, tivemos um crescimento no consumo energético comercial de 80%, no residencial de 60% e na indústria, um vergonhoso, 14%. Por que? O plano de crescimento do governo funcionou, de incentivo ao consumo, teve um crescimento nos serviços e do consumo residencial, mas não teve produção para sustentar o País assim. Essa situação só não está mais caótica, porque a indústria não cresceu. A energia é um termômetro muito claro, te informa o que produziu e o que não. Temo muito hoje pelos meus filhos e netos, porque vê-se que o caminho não está bom”, concluiu.