Vantagens e desvantagens das bandeiras tarifárias

Fonte: Valor Online

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Neste mês começou a vigorar o sistema de bandeiras tarifárias no Brasil. A implementação desse sistema resultará em uma tarifa de energia elétrica que poderá variar mensalmente, o que é uma novidade no país. Para entender o porquê da mudança, deve-se, inicialmente, entender como funciona o sistema de tarifação atual.

O sistema tarifário vigente no país foi estabelecido nos anos 80. Nesse sistema, as tarifas de energia elétrica são reajustadas uma vez por ano, de forma que as distribuidoras possam repassar os custos da compra da energia aos consumidores. Essa compra é definida por contratos, formalizados após os leilões de energia promovidos pelo governo.

Os contratos, em geral, variam de acordo com o tipo de fonte de energia. Simplificadamente, os contratos estabelecidos entre as distribuidoras e hidrelétricas resultam em um custo fixo para as distribuidoras. Já os contratos estabelecidos entre distribuidoras e termelétricas resultam em um custo fixo e um custo variável. A razão é que as termelétricas funcionam como um “seguro” para o país em períodos de seca. Dessa forma, há um custo fixo para implantá-las – equivalente ao valor do seguro – e um custo pelo uso do combustível quando essas fontes são acionadas, equivalente à franquia do seguro. Assim como os seguros, espera-se que as termelétricas não sejam acionadas com frequência.

No entanto, com os fortes períodos de estiagem que o país vem sofrendo, o uso de termelétricas tem aumentado muito nos últimos anos, aumentando também os custos variáveis das distribuidoras. Como as distribuidoras devem esperar até o próximo reajuste tarifário para repassar esse custo, fica caracterizado um problema de fluxo de caixa, no qual as distribuidoras pagam pelo uso das termelétricas, mas não conseguem repassar imediatamente esse custo à tarifa. Nesse cenário, as bandeiras tarifárias aparecem como uma forma de minimizar o problema.

O sistema de bandeiras tarifárias funcionará de forma semelhante aos semáforos, para sinalizar na conta do consumidor se haverá aumento na tarifa de energia do mês seguinte. A cor das bandeiras irá variar de acordo com um preço que define as condições de cada subsistema do país. Quando o preço for menor ou igual a R$ 200/MWh, a bandeira verde estará acionada e não haverá aumento de tarifa para os consumidores desse subsistema. Quando o preço estiver entre R$ 200/MWh e R$ 350/MWh, a bandeira amarela será acionada e a tarifa aumentará em R$ 1,50 para cada 100 kWh consumido. Quando o preço estiver acima de R$ 350/MWh, a bandeira vermelha será acionada e a tarifa aumentará em R$ 3,00 para cada 100 kWh consumidos.

Esses valores não incluem os impostos, que variam de Estado para Estado, e foram calculados com base em uma previsão da arrecadação necessária para reembolsar as distribuidoras devido ao acionamento das termelétricas. Considerando valores médios de impostos da ordem de 30%, calculados por dentro da tarifa, os aumentos chegam a R$ 2,14 e R$ 4,28 para cada 100 kWh consumidos. Em 2014, as bandeiras já apareceram na fatura do consumidor, mas sem a cobrança, apenas como sinalização.

Obviamente, existem vantagens e desvantagens por sua utilização.

Em teoria, a solução é promissora por dois motivos. Primeiro, por aliviar o problema do fluxo de caixa das distribuidoras, que é o principal objetivo de sua aplicação. Segundo, por seu caráter educativo, que induz os consumidores a reduzirem o consumo de energia quando o subsistema mais necessita, contribuindo para a recuperação dos níveis dos reservatórios e reduzindo o uso de fontes mais poluentes.

Na prática, o benefício da aplicação das bandeiras, no entanto, pode ser limitado e com efeitos colaterais. Primeiro, porque dentro de um subsistema existem várias distribuidoras, umas com mais e outras com menos contratos com termelétricas. Entretanto, a variação das tarifas será igual para todos os consumidores dentro deste subsistema. Como resultado, algumas distribuidoras poderão receber mais do que precisam para honrar seus contratos e outras menos. Em ambos os casos, o reajuste tarifário ainda será necessário, seja para repassar aos consumidores a receita excedente das distribuidoras com menos contratos com termelétricas, seja para repassar aos consumidores o custo excedente das distribuidoras com mais contratos com termelétricas.

Além disto, o caráter educativo das bandeiras, e, consequentemente, os benefícios para o subsistema, podem não ser sentidos se os consumidores não responderem adequadamente às variações de preço.

Por exemplo, considerando os impostos, uma família que consome 200 kWh/mês terá um aumento na sua conta de R$ 4,28 quando a bandeira amarela for acionada e R$ 8,56 quando a bandeira vermelha for acionada, o que pode não ser suficiente para sensibilizar esta família a reduzir seu consumo. Já para os consumidores comerciais e industriais, que são menos flexíveis, as variações na tarifa podem chegar a 5% e 11%, por conta do acionamento das bandeiras amarela e vermelha. Estes valores, associados à incerteza quanto ao acionamento destas bandeiras, poderão ter impacto significativo no fluxo de caixa destes consumidores, resultando em prejuízos para a economia como um todo.

Em resumo: considerando o aumento no consumo de energia nos próximos anos, a expansão das fontes renováveis e, consequentemente, a necessidade de novas termelétricas, as bandeiras tarifárias representam um amadurecimento no setor elétrico brasileiro. Entretanto, o sucesso de sua aplicação dependerá do alívio que trará ao fluxo de caixa das distribuidoras, da adequada resposta dos consumidores residenciais às variações da tarifa e de maior flexibilidade dos consumidores industriais e comerciais no consumo de energia elétrica. A solução para estes desafios pode estar nos programas de eficiência energética, nas campanhas de conscientização e no incentivo à expansão de fontes distribuídas e autoprodução de energia.

Délberis Lima é professor do departamento de Engenharia Elétrica da PUC-Rio.

Sobre Alexandre Lara

Alexandre Fontes é formado em Engenharia Mecânica e Engenharia de Produção pela Faculdade de Engenharia Industrial FEI, além de pós-graduado em Refrigeração & Ar Condicionado pela mesma entidade. Desde 1987, atua na implantação, na gestão e na auditoria técnica de contratos e processos de manutenção. É professor da cadeira de "Operação e Manutenção Predial sob a ótica de Inspeção Predial para Peritos de Engenharia" no curso de Pós Graduação em Avaliação e Perícias de Engenharia pelo MACKENZIE, professor das cadairas de Engenharia de Manutenção Hospitalar dentro dos cursos de Pós-graduação em Engenharia e Manutenção Hospitalar e Arquitetura Hospitalar pela Universidade Albert Einstein, professor da cadeira de "Comissionamento, Medição & Verificação" no MBA - Construções Sustentáveis (UNIP / INBEC), tendo também atuado como professor na cadeira "Gestão da Operação & Manutenção" pela FDTE (USP) / CORENET. Desde 2001, atua como consultor em engenharia de operação e manutenção.
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