Sistema revive risco de desabastecimento

Fonte: Valor Online

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“É matematicamente comprovado que há energia suficiente para abastecer o país. Vamos depender, sim, de chuvas, mas sempre foi assim.” A afirmação foi feita pelo ministro de Minas e Energia. A frase, porém, não é do atual gestor da pasta, Eduardo Braga, e, sim, do então ministro Rodolpho Tourinho, em setembro de 2000, oito meses antes de o governo decretar um programa de racionamento de energia.

Quase quinze anos depois, 60 mil megawatts (MW) a mais de capacidade instalada (o equivalente a quatro hidrelétricas de Itaipu) e 60 mil quilômetros de linhas de transmissão construídos (cerca de uma volta e meia ao redor da Terra), o sistema elétrico brasileiro se vê novamente diante do risco de desabastecimento de energia. A crise energética do início do século serviu para pavimentar o arcabouço legal criado nos anos seguintes e que reestruturou o setor elétrico brasileiro.

O “Novo Modelo do Setor Elétrico”, como ficou conhecido o conjunto de regras instituído entre 2003 e 2004, foi baseado no tripé que combinou a retomada do financiamento de longo prazo para a expansão da oferta de energia, a modicidade tarifária e a universalização do serviço de energia. Principal fonte de recursos para o setor de infraestrutura no país, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) teve papel fundamental na expansão do setor elétrico nos últimos 15 anos.

Desde 2003 até hoje, o banco desembolsou R$ 152,6 bilhões, para a implantação de 735 projetos de geração, somando 29,7 mil MW e investimento total de R$ 262,4 bilhões. “A retomada do planejamento, a realização dos leilões de energia nova e de linhas de transmissão e o padrão de financiamento do BNDES foram decisivos para que o Brasil ampliasse a sua capacidade de geração em mais de 60% nos últimos 15 anos”, avalia o coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel) da UFRJ, professor Nivalde de Castro. A partir do “Novo Modelo”, a aprovação de financiamentos para grandes empreendimentos se tornou menos complexa e difícil.

Com a implementação dos leilões de energia, os empreendedores arremataram contratos de longo prazo, com fornecimento de energia e receita garantida por um período de 30 anos (no caso de hidrelétricas), que serviram de garantia para a obtenção do empréstimo junto ao BNDES, que chegava a financiar 70% do valor dos projetos. Esse desenho possibilitou tirar do papel importantes empreendimentos do setor elétrico e expandir a fronteira hidrelétrica do país para a região amazônica, com a construção das usinas de Santo Antônio e Jirau, no complexo do Rio Madeira, em Rondônia; de Teles Pires, na divisa entre o Mato Grosso e o Pará; e da histórica Belo Monte, que, quando concluída, provavelmente em 2019, será a maior usina genuinamente brasileira, com seus 11.233 megawatts (MW) de capacidade instalada.

Nos últimos 15 anos, o setor elétrico também ganhou um “pulmão” termelétrico, que saltou de pouco mais de 10 mil MW para quase 40 mil MW. O parque térmico mais robusto foi o que evitou um colapso no sistema nacional com a escassez de chuvas nos últimos anos. De acordo com dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), com o baixo nível dos reservatórios hidrelétricos, as térmicas estão respondendo por quase um terço de toda a energia produzida pelo país atualmente. Na área termelétrica, vale destacar a retomada do projeto de Angra 3. A terceira usina nuclear do país, com 1.405 MW de capacidade instalada deve ser concluída em 2018. Além dela, segundo o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, o governo estuda construir outras quatro usinas do tipo, de 1 mil MW cada, até 2030 e implantar outras oito termonucleares até 2050.

A ideia é aproveitar o domínio brasileiro da fabricação do combustível nuclear, afinal o país possui a sexta maior reserva de urânio do mundo, com cerca de 310 mil toneladas de U308. Mas o maior destaque no segmento de geração nos últimos anos talvez tenha vindo dos ventos. Desde 2009, quando o Brasil realizou o primeiro leilão de energia eólica, o país se tornou referência mundial em comercialização desse tipo de energia, com um dos preços mais competitivos do mundo. Atualmente, a fonte responde por quase 5 mil MW instalados, o equivalente a pouco mais de 3% de todo o parque gerador brasileiro.

As maiores jazidas de vendo estão no Rio Grande do Norte e Ceará, onde a energia eólica chega a responder por 80% e 40% da matriz elétrica estadual, respectivamente. No segmento de distribuição, houve um crescimento expressivo do número de clientes nos últimos 15 anos, passando de 40,5 milhões para 66 milhões de unidades consumidoras, segundo dados da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee). Na mesma comparação, o consumo de energia saltou de 307,5 mil gigawatts-hora (GWh) para 473,4 GWh. Apenas em 2014, os investimentos no setor totalizaram R$ 12,3 bilhões. Do ponto de vista operacional, o índice de duração de interrupções piorou, passando de 16,87 horas, em média, em 2000, para 18,27 horas, em 2014. Na mesma comparação, porém, o indice de ocorrências de interrupção melhorou, evoluindo de 14,82 registros, em média, para 10,49 registros, no ano passado.

O índice de perdas elétricas totais das distribuidoras também apresentou piora, passando de 11,86%, em 2000, para 13,99% em 2014. Apesar das evoluções observadas na expansão da geração, transmissão e distribuição, uma mudança na orientação política nos últimos cinco anos, com forte impacto no ambiente regulatório, com o objetivo de obter uma redução forçada do custo da energia do país, desequilibrou o tripé que servia de alicerce do “Novo Modelo”. Em outras palavras, a priorização da modicidade tarifária reduziu o ritmo de expansão da oferta de energia. “As impropriedades começaram pela forma que foi promulgada a Medida Provisória 579/2012 [da Renovação das Concessões], sem transparência. O texto foi produzido a portas fechadas por um trabalho de não mais que seis pessoas.

Os erros de gestão levaram a um desarranjo financeiro brutal que se vê até hoje”, lamenta Claudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil, centro de estudos do setor elétrico. O problema foi agravado por uma série de restrições ambientais e jurídicas que impediram ou retardaram a construção de importantes empreendimentos de geração e transmissão de energia. Os atrasos comprometeram o nível de segurança de abastecimento do sistema, agravado ainda mais pelo fraco regime hidrológico dos últimos dois anos, o que levou o Brasil a passar por experiência semelhante a observada no início do século. Segundo uma experiente especialista de uma grande consultoria do setor elétrico, a principal diferença entre a crise elétrica atual e a de 2000/2001 é a falta de transparência com que o governo atual lida com o problema.

“Em 2001, o governo reconheceu o problema e criou a Câmara de Gestão da Crise de Energia. Hoje, o governo insiste em negar que haja uma crise e toma medidas sem discutir com os agentes do setor”, afirma ela. Ao que tudo indica, o ano de 2016 será crucial para o setor elétrico. Com estimativas do Operador Nacional do Sistema de que os reservatórios hidrelétricos chegarão a novembro deste ano com cerca de 10% de armazenamento, o país dependerá de um verão muito chuvoso para que seja possível evitar um racionamento de energia no próximo anos. De acordo com a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), o parque gerador brasileiro deverá crescer para 195 mil MW nos próximos dez anos, segundo estimativas contidas no Plano Decenal de Energia (PDE) 2023.

Sobre Alexandre Lara

Alexandre Fontes é formado em Engenharia Mecânica e Engenharia de Produção pela Faculdade de Engenharia Industrial FEI, além de pós-graduado em Refrigeração & Ar Condicionado pela mesma entidade. Desde 1987, atua na implantação, na gestão e na auditoria técnica de contratos e processos de manutenção. É professor da cadeira de "Operação e Manutenção Predial sob a ótica de Inspeção Predial para Peritos de Engenharia" no curso de Pós Graduação em Avaliação e Perícias de Engenharia pelo MACKENZIE, professor das cadairas de Engenharia de Manutenção Hospitalar dentro dos cursos de Pós-graduação em Engenharia e Manutenção Hospitalar e Arquitetura Hospitalar pela Universidade Albert Einstein, professor da cadeira de "Comissionamento, Medição & Verificação" no MBA - Construções Sustentáveis (UNIP / INBEC), tendo também atuado como professor na cadeira "Gestão da Operação & Manutenção" pela FDTE (USP) / CORENET. Desde 2001, atua como consultor em engenharia de operação e manutenção.
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